Por Caio César | 28/04/2025 | 5 min.

Muitas vezes, nos deparamos com sequências de acompanhamentos que, em meio à correria diária, acabam ficando em segundo plano, com pouca ou nenhuma menção em nossos espaços cibernéticos.
Recentemente, o Grande ABC ofereceu uma série de demonstrações em torno da mentalidade rodoviarista, que ainda predomina e reforça o triste diagnóstico da mais recente edição da Pesquisa Origem e Destino. A cobertura pouco crítica da imprensa local, que costuma ser ainda mais fraca do que os veículos sediados na capital, contribui para criar um clima de propaganda e normalização, sem suscitar grandes dores de cabeças às prefeituras.
Refiro-me às seguintes iniciativas:
- Complexo Santa Terezinha (obras iniciadas em 2022; nova ponte entregue em 2023; primeira etapa concluída em 2024), com pontes e viadutos que não serão suavizados pela ampliação de uma praça;
- Construção do Viaduto Estaiado Robert Kennedy (anunciado em 2021; entrega prometida para dezembro), associado ao Corredor Marginal Ribeirão dos Couros (serão dois novos viadutos; acesso de 2,2 km entregue em 2024);
- Novo viaduto estaiado de integração das avenidas Lucas Nogueira Garcez e Pereira Barreto (anunciado em abril);
- Novo viaduto estaiado na região central de São Caetano do Sul (entregue em 2024);
- Novo viaduto entre as avenidas Presidente Kennedy e dos Estados (anunciado em fevereiro, mas sem previsão), associado à ampliação do Complexo Viário Luiz Tortorello;
- Remoção do calçadão da Rua do Comércio (anunciado em março), com a reabertura para tráfego de veículos de passeio;
- Remoção da ciclovia que conectava o Terminal Rodoviário Nicolau Dedic e a Estação São Caetano do Sul à Avenida Goiás (executada em fevereiro);
- Construção de acesso ao km 16 da Rodovia Anchieta (entregue em 2024) junto à Avenida Lions;
- Duplicação da Estrada dos Alvarengas (nova etapa anunciada em 2023; etapa anterior entregue em 2020).
O caso do calçadão em Ribeirão Pires é especialmente simbólico, sendo fruto da insistência do prefeito bolsonarista Guto Volpi (PL) em torno de uma visão anacrônica. Ainda que a cidade tenha pouco mais de 100 mil habitantes, Guto tenta destruir parte do pequeno calçadão sem audiências públicas. Apesar de o investimento de R$ 1 milhão parecer simbólico quando comparado com os viadutos mastodônticos das cidades vizinhas, o impacto será extremo, uma vez que interferirá numa área com elevado fluxo de pessoas e uma série de equipamentos de caráter cívico ou turístico, incluindo a estação da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e o terminal de ônibus construído pela prefeitura, que abriga linhas municipais e intermunicipais.
O argumento do prefeito bolsonarista, infelizmente, é o mesmo que encontramos em figuras como Guilherme Boulos (PSOL): mais apartamentos se traduzem em mais carros, logo, mais carros exigem mais asfalto. A única diferença diz respeito ao aspecto regulatório: permissividade de um lado e obstrução do outro. O resultado, nos dois casos, nada mais é do que um grande fracasso ancorado em premissas rodoviaristas.
A argumentação em São Caetano do Sul, tanto na imprensa, quanto no Legislativo, também não difere fundamentalmente daquele que poderá prejudicar o tráfego de pedestres numa estância turística com acesso sobre trilhos (algo raro no estado de São Paulo após o desmonte de milhares de km de ferrovias, devido à privatização da Rede Ferroviária Federal). Tite Campanella (PL), foi bastante objetivo quando declarou à imprensa que vagas de estacionamento tinham prioridade, demonstrando incapacidade de refletir sobre a aludida queda na movimentação comercial e o tipo de comportamento que sua cidade tem sedimentado.
Fala-se aqui de investimentos extremamente questionáveis que somam centenas de milhões de reais — em São Bernardo do Campo, são cerca de 200 milhões, basicamente o mesmo montante queimado em Santo André. Ora, somente no novo acesso ao km 16 da Anchieta, São Bernardo do Campo gastou mais de 30 milhões de reais. Polêmico, o novo acesso se transformou numa piada e é sinônimo de estresse, simbolizando um rodoviarismo que não é apenas predatório, mas também eleitoreiro.

Introdução Nos últimos meses a Linha 18-Bronze (Tamanduateí-Djalma Dutra), que tem tudo para ser mais uma PPP (parceria público-privada) fracassada, tem sido envolvida em discussões sobre mobilidade urbana que adotam as premissas erradas e, como não poderia deixar de ser, chegam a conclusões equivocadas ou até mesmo desonestas. Considerando que já travamos uma série de discussões na página, que temos vários membros que moram e/ou estudam e/ou trabalham em municípios do Grande ABC (também chamado de ABC Paulista, ABC, ABCD e ABCDMMR, embora a denominação oficial seja Sub-região Sudeste da Região Metropolitana de São Paulo) e que não seria de bom tom ignorar o que vem acontecendo, estamos publicando um artigo a respeito.
Diante dos fatos, a musculatura financeira de uma das principais concentrações urbanas do estado parece inegável: o Grande ABC tem, sim, recursos para fazer obras de impacto no sistema viário, porém, continua a privilegiar o transporte individual motorizado. O teleférico que beneficiaria bairros como Montanhão e Parque Selecta custaria uma fração do acesso ao km 16, mas uma década após a contratação de um estudo, o equipamento não saiu do papel (e, provavelmente, não sairá tão cedo), já o teleférico tido como o “maior projeto turístico do ABC”, anunciado pela Estância Turística de Ribeirão Pires em 2014, deu sinais de que não avançaria já no ano seguinte, patinando em 2017 num balé que envolvia até órgãos estaduais e federais — as obras foram desfeitas posteriormente, quando o bastão do Executivo passou do MDB (Movimento Democrático Brasileiro) para o PSB (Partido Socialista Brasileiro).
Não aprendemos, não é mesmo? O vexame está garantido, seja em mais alças e trevos, seja em teleféricos vaporosos (quando não apodrecem e viram sucata abandonada).
É fundamental que mais pessoas da região se unam e exijam projetos de mobilidade condizentes com o momento atravessado não só pelo país, mas pelo mundo inteiro. Não construiremos cidades mais resilientes impermeabilizando nosso solo e poluindo nosso ar com veículos ineficientes de uma tonelada. Para encerrar em grande estilo, o piscinão Jaboticabal, que se arrasta enquanto o atual governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos) comemora a terceirização de suas responsabilidades para múltiplas concessionárias, é a cereja que faltava: mostra que não só ampliamos sistemas viários daninhos, como também inutilizamos áreas imensas para sustentá-los e normalizamos recorrentes lamaçais e faltas de energia elétrica.
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