Após 40 anos, Zona Leste receberá empreendimento de uso misto à altura de suas linhas de metrô

Por Caio César | 25/03/2023 | 4 min.

Legenda: Maquete digital do empreendimento, exibindo a fachada voltada para a Radial Leste
Complexo deve combinar mais de cinco tipos distintos de usos num mesmo local, preenchendo vácuo histórico e reiterando vocação de centralidade da região do Tatuapé. Anúncio não parece ter atraído a atenção de associações retrógradas

Longe dos olhares de reprovação dos reacionários urbanísticos dos “três pês do apocalipse” (Pinheiros, Pacaembu e Perdizes), a Porte Engenharia e Urbanismo anunciou seu mais novo empreendimento imobiliário, batizado de Urman São Paulo e posicionado entre o Sesc Belenzinho e a Estação Belém da Linha 3-Vermelha (Corinthians·Itaquera-Palmeiras·Barra Funda). De acordo com a Gazeta do Tatuapé, o lançamento ocorreu no último final de semana, durante os dias 18 e 19 de março.

Integrante de um conjunto de empreendimentos que se articulam linearmente por meio do sistema viário lindeiro à face sul do tronco metroferroviário da Zona Leste paulistana, o Urman promete entregar um audacioso conjunto de edificações de uso misto, que combina centro de convenções e eventos, unidades hoteleiras, unidades habitacionais de diferentes tipos, lajes corporativas, salas de cinema, teatro, restaurantes, lojas e centro de saúde.

Legenda: Maquete digital do empreendimento, exibindo os diferentes usos previstos no conjunto. Créditos: Porte Engenharia e Urbanismo

Diferente da baleia de aspecto fálico e gosto duvidoso, presente na praça do edifício B32, na Faria Lima, a praça central do Urman, tal como projetada pelo escritório Aflalo/Gasperini, com mais de 2 mil m², dotada de mobiliário e de uma obra de arte que envolve as diferentes escalas e usos, poderá estimular travessias e permanências numa área que, exceto pelo Sesc, não oferece grandes motivos para circulação de pedestres.

Legenda: Planta do empreendimento, exibindo a implantação do térreo, na mesma cota da Radial Leste (av. Alcântara Machado) e r. Padre Adelino. Créditos: Porte Engenharia e Urbanismo

Considerando que, desde 1981, quando foi inaugurada, suplantando a (então existente) Estação Clemente Falcão, a Estação Belém tem sido marcada por um movimento fortemente pendular, que ocorre em meio a um tecido de baixo gabarito, baixa densidade e baixa complexidade, cuja vocação residencial parece ter sido reforçada com a desindustrialização da Região Metropolitana de São Paulo, acaba sendo pouco razoável rechaçar o Urman. Um hiato urbanístico de mais de 40 anos chega ao fim.

Localizando-se fora dos vetores tradicionais de acumulação de capital, a empreitada já foi alvo da miopia jornalística costumeira, em reportagem recente, o Estadão, pouco afeito à Zona Leste, derrapou na leitura territorial. A articulação necessária referida acima, batizada pela Porte de Eixo Platina, foi compreendida como o Estadão pegando (sic) os “bairros dos Tatuapé, Belém, Vila Carrão, Vila Formosa, Água Rasa e Mooca”. Rude equívoco. Em que pese a existência freestyle dos bairros paulistanos, cujos limites nunca foram oficialmente definidos, é exagero posicionar as ruas Platina e Padre Adelino em tantos bairros.

Legenda: Composição com aerofotografia do tecido urbano ao sul das estações Carrão, Tatuapé e Belém, identificando pontos de interesse, além de empreendimentos da Porte no Eixo Platina. Créditos: Porte Engenharia e Urbanismo

O mesmo texto do Estadão também surpreendeu pelo tom pessimista. O periódico da família Mesquita não poupou o empreendimento para mobilizar, em duas passagens, críticas ao ambiente macroeconômico brasileiro.

Embora o ambiente de juros altos e incertezas sobre os rumos da economia brasileira tenha colocado muitos projetos imobiliários em compasso de espera, a Porte Engenharia e Urbanismo decidiu abrir os estandes do seu novo megaempreendimento.

[…]

Apesar do ambiente macroeconômico turbulento, a Porte decidiu seguir com o lançamento confiante na rentabilidade no longo prazo. As obras vão levar cinco anos para ficar prontas, o que dá o tempo necessário para evoluir na comercialização de tantos metros quadrados.

Obviamente, o Urman não se propõe a solucionar os problemas habitacionais da Zona Leste, tampouco demonstra estar posicionado para o mercado de habitação de baixo custo, no entanto, devido às fragilidades econômicas e ao menor acúmulo de capital presente na região, o empreendimento é bem-vindo, não só por ampliar o número de postos de trabalho em diferentes setores comerciais e de serviços, mas por reforçar o papel do Tatuapé como centralidade metropolitana, podendo ser a última fronteira não só para quem nasceu “do lado leste da força” e não tem nenhuma pretensão ou possibilidade de mudar de endereço, mas também para quem pode se mudar e, com isso, retroalimentar o ciclo de fuga de capital intelectual e financeiro.

Depois do polêmico Platina 220, edifício que finalmente fez justiça à presença de três linhas paralelas de alta capacidade, rompendo com o duo sobrado e shopping, o Urman chega para contribuir com a qualificação urbanística ao longo da Radial Leste. Enquanto o Platina 220 resultou na demolição de edificações antigas de 2 andares, boa parte da área do Urman ocupará um lote ocioso há cerca de 10 anos.




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