Integrando linhas da CPTM por meio do Rodoanel

Por Caio César | 10/07/2015 | 9 min.

Legenda: Rodoanel observado através das janelas de um trem da Linha 10-Turquesa
Com a inauguração do tramo leste do Rodoanel Mario Covas, alguns membros do Coletivo colocaram em pauta a discussão sobre o papel do anel rodoviário para a integração entre as sub-regiões da Região Metropolitana de São Paulo. Pretendemos suscitar a exploração breve do tema, tendo como elemento-chave o emprego de ônibus expressos para conexão entre estações da CPTM

Índice


Introdução

Ainda que desperte uma problemática própria, o Rodoanel visa reduzir a indução de ocupações informais lindeiras, para tanto, a principal medida do Governo do Estado de São Paulo, visando também preservar o propósito primordial da rodovia (retirar veículos e caminhões de passagens de outras vias da capital e cidades da Região Metropolitana de São Paulo), foi de reduzir deliberadamente a quantidade de acessos ao anel rodoviário. Trata-se de um aspecto que limita, por exemplo, o potencial de park and ride (estacionamento para deixar o carro e ir de transporte coletivo) nas estações propostas, ainda que não signifique sua eliminação por completo. O foco, portanto, está no fornecimento de serviços expressos por linhas da EMTU, que farão trajetos como Poá-Ribeirão Pires.


Rodoanel

O anel rodoviário recebe a sigla SP-21 e tem como nomes Rodoanel Mario Covas ou Rodoanel Metropolitano de São Paulo, sendo comumente chamado de Rodoanel. Sua extensão total é de aproximadamente 180 km, dos quais 132,5 km já foram construídos com a entrega dos trechos oeste (2002), sul (2010) e leste (2014).

Legenda: Mapa do Rodoanel, utilizado em propaganda recente do Governo do Estado de São Paulo

Trata-se de uma rodovia concessionada e com praças de pedágio (como é praxe no modelo de administração do governo paulista). O trecho oeste é de responsabilidade da CCR e os trechos sul e leste têm como responsável a SPMAR.


Características

Confira a seguir as características gerais do serviço proposto por nós.

Ônibus

O rodoanel apresenta algumas limitações quanto à oferta de postos de serviços automotivos, o que inclui postos para abastecimento, talvez parte da política de redução de variáveis indutoras de ocupação do tecido lindeiro.

Legenda: Blog Ponto de Ônibus. Modelo híbrido a etanol da Eletra

Caso a decisão signifique entraves para a operação de ônibus movido apenas por um motor de combustão instantânea (muito provavelmente alimentado por óleo diesel), lembramos que o mercado oferece outras tecnologias, como ônibus movidos a bateria ou híbridos (combinação de motor elétrico movido a bateria com um motor a combustão).

O governo estadual já acumula experiência operando ônibus com outras matrizes de energia, que podem ser observados no Corredor Metropolitano ABD da EMTU. Dois fortes nomes do setor são Eletra (brasileira) e BYD (chinesa).

Em termos de autonomia, podemos adiantar o seguinte:

  1. Em circulação comercial pelo Corredor ABD, a Eletra possui um modelo de ônibus articulado, 100% elétrico com baterias, cuja autonomia é de 200 km;
  2. Em circulação na usina hidrelétrica de Itaipu, a Eletra possui um modelo de ônibus padrão, híbrido, que combina motor movido a etanol e banco de baterias, cuja autonomia é de 300 km (60 km no modo 100% elétrico);
  3. Tendo sido testado em várias cidades brasileiras, a BYD possui um modelo de ônibus padrão, 100% elétrico com baterias, cuja autonomia é de 250 km.

Os ônibus devem ser acessíveis e com boa ergonomia na disposição interna e nas poltronas. Internamente, a EMTU pode padronizar os assentos com o mesmo tipo empregado no serviço suburbano do Airport Bus Service (linhas 257 e 299).

Modelo de operação

Diante do histórico da EMTU, a proposta é por uma concessão dedicada do serviço em questão, com dois ou mais lotes. Os ônibus devem seguir rigidamente as normas do serviço e ter padrão de pintura diferenciada, assim como ocorre com a concessionária Metra. O regime tarifário deve ser objeto de estudo, porém, para que o papel integrador possa ser desenvolvido com plenitude, não pode existir cobrança de tarifa cheia, no valor de R$ 3 ou mais. Idealmente, a tarifação, se qualquer, não deve exceder o valor de integração já praticado pela política do Bilhete Único na capital.

Estações

Em relação às estações inauguradas nos últimos anos, não devem ter diferenças significativas, devem cumprir com as normas de acessibilidade e apresentar bom projeto arquitetônico e urbanístico, dialogando adequadamente com espaço na qual se inserem. A diferença está no cuidado com a oferta de comércio e serviços, uma vez que a estação é um hub (concentrador) e tem como função a conexão entre os trens da CPTM e os ônibus da EMTU.


Linhas

Foram identificadas a possibilidade de 4 ligações-base ao longo do Rodoanel, as quais são descritas a seguir, incluindo propostas para novas estações e alterações viárias, quando aplicável.

Alto Tietê-Grande ABC

Atualmente a ligação rodoviária coletiva entre o Alto Tietê e o ABC se dá por ônibus intermunicipais da EMTU que fazem uso da obsoleta e malfadada Rodovia Índio Tibiriçá. Trata-se de uma ligação com menor segurança e velocidade, que não explora o potencial intermodal, não podendo ser enxergada como infraestrutura para um serviço confiável e atrativo; em termos de ligação ferroviária, a única ligação existente e direta entre as duas sub-regiões tem como características o emprego de via singela e uso predominantemente voltado ao escoamento de carga pela MRS Logística, logo, exigindo ser objeto de outro tipo de intervenção para poder transportar passageiros, bem como para proporcionar uma ocupação com impacto reduzido ao meio ambiente. A ausência de uma ligação ferroviária direta e a falta de uma ligação rodoviária direta confiável, implica no virtual isolamento, uma vez que um trajeto predominantemente ferroviário (o meio mais confiável) exige 3 horas de deslocamento.

Legenda: Estação Calmon Viana

No Alto Tietê, são propostas duas estações em substituição a paradas existentes, mas inadequadas: Calmon Viana e Aracaré, tendo sido a primeira modernizada em 2010 e a segunda apenas reformada ao longo dos anos pela CPTM, mantendo sua estrutura de 1950 pouco alterada. No Grande ABC, é proposta uma estação, que se apropria da função de transposição do Rodoanel com segregação em nível, substituindo a ponte existente.

É possível então uma ligação, com parada em três estações. Existe potencial para um tempo de viagem de aproximadamente 30 minutos entre a estação da CPTM em Calmon Viana e a estação de transferência proposta em Ribeirão Pires. Inferior à utilização das linhas 11-Coral e 10-Turquesa numa viagem de mais de 3 horas ou da linha 215 da EMTU, que parte de Suzano e leva mais de 1 hora. Vale mencionar que uma viagem entre as estações Suzano e Calmon Viana leva aproximadamente 3 minutos pela Linha 11-Coral.

Legenda: Região do bairro Calmon Viana, em Poá, com a estação das linhas 11-Coral e 12-Safira da CPTM à esquerda e o Rodoanel à direita

A população do Alto Tietê e do extremo da Zona Leste de São Paulo passaria a ter acesso facilitado ao Grande ABC, ao passo que a recíproca também seria verdadeira. Seria factível que um habitante de Suzano, Mogi das Cruzes ou Poá, por exemplo, se deslocasse até Santo André para fazer compras. Alguns exemplos de equipamentos cujo acesso seria facilitado:

Osasco-Grande ABC

Atualmente é possível ir de Osasco até São Bernardo do Campo pela linha seletiva 280 da EMTU, cujo tempo total de percurso é de impressionantes 3 horas, passando por regiões como a Av. Berrini e o município de Diadema. Utilizando o sistema de trilhos, uma viagem entre Osasco e Ribeirão Pires ultrapassa 3 horas.

Legenda: Detalhe da placa lateral com vias principais do itinerário da linha 280

Existe potencial para oferecer viagens expressas com tempo de percurso de aproximadamente 90 minutos. Para tanto, propomos que sejam feitas adequações (as intervenções podem consistir em modernização ou reconstrução completa) na Estação General Miguel Costa (ex-Km 21) da Linha 8-Diamante. Atualmente a estação já apresenta algum grau de facilidade de conexão com ônibus municipais e intermunicipais, além disso, no passado já houve fácil kiss and ride (área para deixar ou pegar carona) e park and ride (estacionamento para deixar o carro e ir de transporte coletivo) tímido.

Legenda: Estação General Miguel Costa, vizinha do Rodoanel. À direita, mais acima, temos a Avenida dos Autonomistas, referência importante em Osasco

Assim como mencionado na proposta ligar as regiões do Grande ABC e do Alto Tietê, a proposta para conexão do Grande ABC com a Sub-região Oeste necessita da estação de transferência em Ribeirão Pires, aproveitando a passagem da Linha 10-Turquesa sobre o Rodoanel, feita por ponte com segregação em nível.

Recanto dos Humildes-Osasco

O Rodoanel passa sobre a Linha 7-Rubi entre as estações Perus e Vila Aurora, assim, propõe-se a construção de nova estação, dotada de alças de acesso para ônibus, que permite chegar em Osasco sem passar pelo Centro Expandido, ou seja, sem utilizar a Estação Palmeiras-Barra Funda.

Legenda: Linha 7-Rubi entre as estações Perus (ao norte) e Vila Aurora (ao sul). Trilhos passam sob as pistas do anel rodoviário

Uma observação adicional é que a implantação da estação precisa ser cuidadosa em vista do tipo de ocupação do solo com predomínio nas cercanias da ferrovia.

Atualmente não existe qualquer tipo de ligação direta entre São Paulo e Osasco na região, existem ligações a partir da Lapa, mas são de cunho parador e não possuem como objetivo a integração que está sendo proposta aqui.

O potencial é que a viagem entre as duas linhas da CPTM leve 30 minutos, terminando na Estação General Miguel Costa. Completando a viagem com a Linha 8–Diamante da CPTM, é possível acessar o forte comércio da região central de Osasco, e, se houver ainda a utilização dos ônibus locais na região da Estação Comandante Sampaio, é possível acessar equipamentos como:

Usando a Linha 8, o trajeto entre as estações General Miguel Costa e Osasco leva 10 minutos, enquanto o trajeto entre as estações General Miguel Costa e Comandante Sampaio leva 5 minutos.

Alto Tietê-Recanto dos Humildes

Aproveitando a estação proposta para construção na região do Recanto dos Humildes, pertencente à Linha 7-Rubi, sugere-se uma linha expressa para o Alto Tietê, que utilizaria o futuro tramo norte do Rodoanel.

Uma ligação do tipo, hoje, por meio da CPTM, exige cerca de 3 horas de viagem. Pelas rodovias existentes, proprietários de automóveis podem fazer a viagem em menos da metade do tempo, assim, acredita-se que, uma vez concluído o novo trecho do anel rodoviário, seria possível ir de uma sub-região à outra em 60 minutos ou menos.

A ligação potencializa o acesso ao comércio e serviços do Alto Tietê, além de equipamentos públicos e privados, tais como:

Assim como nos outros casos, após chegar na estação de transferência, o acesso à maioria dos equipamentos exigirá complementar a viagem com um trem metropolitano e/ou um ônibus municipal.


Conclusão

Nossa proposta tem como objetivo criar uma nova dinâmica no acesso a equipamentos existentes, bem como induzir o surgimento de novos equipamentos, o que fortalece determinadas cidades como subcentralidades/centralidades regionais, reduzindo assim a dependência do Centro Expandido da capital paulista.

O Rodoanel é uma obra vultuosa, que pode auxiliar não só na logística de carga, mas também de passageiros. Com as ligações propostas, o acesso direto à rodovia só pode ser feito pelos ônibus, o que inibe a possibilidade do Rodoanel terminar como o anel delimitador do Centro Expandido da capital paulista (minianel viário).

Desenvolver a Região Metropolitana de São Paulo passa pela maior integração entre as diferentes sub-regiões que a integram, sendo assim, nada mais justo do que empregar a infraestrutura do Rodoanel para tanto.


Colaborações: Diego Vieira e Renato Martins



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