Gestão frouxa da EMTU transmite abandono e descaso

Por Caio César | 21/10/2019 | 6 min.

Legenda: Ônibus da Publix na linha 102, que atende as estações São Caetano do Sul e Oratório do sistema metroferroviário
Obras em ritmo lento, projetos que não avançaram para além dos estudos funcionais, empresas operadoras que sabotam a operação ou operam precariamente, tudo ocorrendo sob conivência da EMTU

Índice


Introdução

Contatar a EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) pelos canais oficiais é garantia de respostas genéricas, enviadas na forma de e-mails sem assunto, que não raramente chegam em horários nada comerciais, incluindo domingos. O relacionamento entre a estatal e os passageiros, que dependem dos serviços de permissionários e concessionários, não demonstra ser capaz de entregar soluções e melhorias.


Marasmo

É lamentável observar que a empresa não possui nenhuma prioridade orçamentária, pois claramente não vai entregar nenhum dos corredores projetados nas gestões passadas.

Legenda: Rede futura de corredores da EMTU: mapa de baixa resolução é o único disponibilizado no site oficial

Os corredores são importantes elementos para estruturar o transporte metropolitano, pois identificam as paradas com nomes, conferindo-lhes um papel referencial importante, garantem que a estrutura dos pontos terá uma maior qualidade e padronização, oportuna a racionalização de linhas e atendimentos, reduz o tempo de viagem e a emissão de poluentes decorrentes da queima de diesel em congestionamentos, entre outros benefícios socioeconômicos.

Considerando que o Corredor Metropolitano ABD nasceu em 1988, vamos focar apenas nos corredores mais novos, que supostamente serão os seguintes no horizonte de médio a longo prazo (há outros corredores projetados, mas não existe horizonte de implantação claro no momento):

Legenda: A extensão somada é de 85,9 km. Nada mau, pena que mais da metade não existe ainda

Se os poucos corredores projetados e que avançaram até a fase da operação parcial ou do projeto funcional, se encontram praticamente paralisados, com exceção do Corredor Metropolitano Itapevi-São Paulo, que está em obras e inclusive tem modificado o trânsito em Carapicuíba, como podemos esperar uma evolução substancial no transporte sobre pneus entre diferentes municípios da Grande São Paulo?


Permissionários

Enquanto os corredores patinam em outros pontos da região metropolitana, os municípios do Grande ABC precisam conviver com os péssimos serviços de meia dúzia de empresários, que pulverizam a operação em diferentes empresas, cuja estrutura não parece ser das maiores. Empresas endividadas, veículos adquiridos de segunda mão do Rio de Janeiro, sujeira, falta de manutenção, displicência na configuração dos painéis digitais, relaxo na aplicação da pintura, descumprimento de horários, funcionários sem uniforme e fiscais grosseiros são rotina. As poucas empresas que mais bem operam são aquelas que possuem negócios para além das permissões da Área 5 e, mesmo assim, não são verificados ônibus com motor traseiro e piso baixo em nenhuma delas.

Legenda: Resumo das empresas permissionárias da Área 5, correspondente ao Grande ABC

Ironicamente, os únicos ônibus de piso baixo que aparecem rodando em linhas urbanas são aqueles que o Baltazar adquiriu da finada empresa Oak Tree, que operava na capital paulista. Os ônibus geralmente circulam entre São Paulo e São Bernardo do Campo pela Viação Riacho Grande, nas linhas 152 (Terminal Sacomã-Área Verde) e 153 (Terminal Sacomã-Conjunto Terra Nova II), que possuem cerca de 20 km de extensão e encaram a Rodovia Anchieta.

Legenda: Letreiros mal configurados: “PQ DON PEDRO” e “TERM SACAMA” ao invés de “PQ DOM PEDRO II” e “TERM SACOMÔ
Legenda: Seletivo, adquirido de segunda mão de empresa do Rio de Janeiro pela Viação Imigrantes, é socorrido pela Viação São Camilo

Já a empresa Parque das Nações, chega a beirar o caricato, operando com ônibus extremamente velhos e tecnologicamente obsoletos. Não são ônibus de 10 nem de 20 anos, mas sim cerca de 30 anos de idade. Moradores do Conjunto Habitacional Teotônio Vilela e entorno convivem com essa realidade e precisam se sujeitar a isso caso desejem ou precisem ir até o município de Santo André, que polariza como centralidade para aquelas periferias paulistanas. Obviamente os veículos não possuem acessibilidade, embora circulem numa ligação troncal supostamente importante pela linha 265 (Conjunto Habitacional Teotônio Vilela-Terminal Metropolitano Santo André Leste).

Legenda: Vídeo recente (07/10/2019) mostra que a Parque das Nações segue utilizando veículos totalmente inadequados para o transporte intermunicipal

Sabotagem

A seguir, compartilhamos um exemplo lamentável, enviado pelo leitor Rafael Justino, que há anos aponta irregularidades na prestação de serviços pelo Consórcio Unileste, que opera no Alto Tietê.

Esperei passar o domingo pra confirmar as irregularidades aqui no Unileste. A linha 327 - Term. Kemel x Metrô Itaquera via Pq. dos Sonhos foi desativada aos domingos e feriados sem autorização da EMTU. Os próprios funcionários da empresa confirmaram que a linha não voltará a operar. Além disso, aos sábados domingos e feriados, as linhas 315 - Est. de Poá x Est. Itaim e 460 - Ferraz Vila São Paulo x Artur Alvim estão rodando com um veículo a menos do que o determinado pela EMTU. Aos sábados cada uma deve rodar com 3, porém rodam com 2. Aos domingos a determinação são 2, mas rodam com apenas 1 e intervalos que ultrapassam 2 horas. A terceira irregularidade é na linha nova, 843 - Nova Poá x Est. Suzano, que todos os dias da semana está rodando com um veículo a menos. Em dias úteis devem ser alocados 4, mas rodam apenas 3. Aos sábados devem rodar 3, mas rodam apenas 2, e domingo a OSO é de 2, mas roda apenas 1 veículo. O pior é que a empresa nem esperou a demanda se acomodar, para já cortar partidas. Se a linha não está dando demanda, é porque foi mal estudada pela EMTU (aliás é sobreposta à uma municipal de Suzano), porém para realizar tais alterações nos horários e frota, os passageiros devem ser devidamente comunicados, visando o princípio da publicidade em serviços públicos. Sexta feira, com a fiscalização da EMTU na Nova Poá, parece que a empresa Radial realocou às pressas um veículo para a linha, para não ser autuada.

Como pode ser evidenciado, as empresas adotam estratégias sujas na operação e sabotam a operação até atingir os resultados desejados, postura esta que só é coibida com a escassa fiscalização estatal, que ocorre de forma esporádica.

Justino já chegou a acionar até o Ministério Público, mas não teve sorte. Na época, ele e outros passageiros sofriam durante a transição da CS Serviços para a Radial Transportes, que acabou dominando o consórcio com a saída da CS Serviços, segundo ele “a Radial boicotou as linhas no período da transição das linhas da CS. Ela deixou algumas linhas inoperantes, outras operando somente metade do período, tudo sem autorização da EMTU. Como as partidas não eram cumpridas, logo os passageiros não eram transportados, e assim ela conseguia autorização pra diminuir a frota alegando que a demanda caiu, sendo que a queda foi forjada”.


Conclusão

É triste que normalizemos a atuação vergonhosa da EMTU, que não readéqua a infraestrutura e não garante o cumprimento de padrões elevados e rigorosos na prestação de serviços. O regime de concessão, embora pareça contribuir para permitir um arranjo menos precário entre as empresas interessadas, ainda assim está longe de ser uma panaceia. Finalmente, como a estatal se omite e fornece respostas insatisfatórias, nós do COMMU acabamos recebendo reclamações de passageiros.




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