Um olhar para a Linha 7-Rubi da CPTM

Por Caio César | 16/03/2015 | 8 min.

Legenda: Entardecer na Estação Palmeiras-Barra Funda
Nascida no século XIX, a Linha 7-Rubi da CPTM é parte do legado de uma antiga ligação ferroviária entre Santos e Jundiaí, atendendo municípios como Francisco Morato, Franco da Rocha e Caieiras

Índice


Introdução

Em 1867 a primeira ferrovia do Estado de São Paulo nascia pelas mãos da SPR (The São Paulo Railway Company, Limited). Conectando Santos a Jundiaí, seu legado sobrevive até os dias atuais e, no contexto de um atendimento metropolitano, duas linhas da CPTM são responsáveis por atender as cidades compreendidas entre Jundiaí e Rio Grande da Serra:

  • Linha 7-Rubi, conectando a Estação Luz à Estação Jundiaí;
  • Linha 10-Turquesa, conectando a Estação Brás à Estação Rio Grande da Serra.

Buscaremos discutir um pouco a situação da Linha 7-Rubi.


Passado

Durante o período de estatização da SPR, iniciado na década de 1940, principalmente incluindo a incorporação da então EFSJ (Estrada de Ferro Santos-Jundiaí) pela RFFSA (Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima) foram realizadas, entre as décadas de 1950 e 1960, obras no trecho compreendido entre as estações Mauá e Pirituba, cujo resultado foram estações mais modernas e maior flexibilidade operacional. Na década de 1980, foram também adquiridos novos trens.

Com a crescente precariedade dos serviços de passageiros que hoje consideramos como sendo metropolitanos, chamados de trens urbanos naquela altura, as mudanças das obras ligadas à infraestrutura e renovação do material rodante foram gradativamente perdendo seu impacto inicial.

Legenda: Da esquerda para a direita: integração precária com a Estação Brás do Metrô; garotos apontando para o fotógrafo na Estação Lapa, então repleta de pichações. Para as duas fotos, a autoria é desconhecida

Com a chegada da CPTM como operadora em 1994, foi dado início ao processo de recuperação e modernização dos serviços, sendo o ano de 1996 um dos mais conturbados. Em consulta à Wikipédia foi possível obter facilmente o link com o texto da ação do Ministério Público, do qual destaco o seguinte fragmento, preservando os grifos originais:

Segundo consta do incluso inquérito civil, durante tumulto (“quebra-quebra”) ocorrido na manhã do dia 14 de outubro de 1996, na Linha Noroeste-Sudeste da COMPANHIA PAULISTA DE TRENS METROPOLITANOS — CPTM, na Zona Oeste da Capital, depois que uma composição, num trecho elevado, perdeu a tração e foi obrigada a parar, as estações de trem Francisco Morato, Baltazar Fidelis, Franco da Rocha, Jaraguá, Perus e Vila Clarice foram depredadas e seis vagões de trens foram destruídos pelo fogo ateado pelos manifestantes.

Esses fatos acarretaram a interrupção do tráfego no trecho entre Jundiaí e Pirituba e a interdição de 11 (onze) estações, de modo a prejudicar cerca de 60 (sessenta) mil usuários desse serviço essencial, pois, em virtude dessa interdição, para completar o percurso, estão sendo obrigados a utilizar ônibus da Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos — EMTU e, consequentemente, a desembolsar R$ 1,40 (um real e quarenta centavos) a mais por viagem, ou seja, além dos R$ 0,80 (oitenta centavos) que pagam pela viagem de trem até o trecho interrompido e que antes lhes dava o direito de realizar toda a viagem. Outros, para evitar descontos e faltas na folha de pagamento no fim do mês, optaram por desembolsar de R$ 3,00 a R$ 5,00 pelo transporte em lotações, como é o caso de Gilson Leite da Silva, morador de Francisco Morato, que trabalha em um escritório na Lapa de Baixo [V. jornal “O Estado de S. Paulo, ed. de 16.10.96, p. C6].


Presente

Legenda: Usuários embarcando na Estação Lapa da Linha 7-Rubi da CPTM em direção à Estação Francisco Morato

Apesar da maior confiabilidade do serviço atingida nos últimos anos, principalmente em comparação com a criticidade da década de 1990, o peso da idade permanece difícil de negar, se desconsiderarmos a situação das estações Luz e Brás devido às intervenções do Projeto Integração Centro, podemos afirmar que a Linha 7 possui sete estações centenárias, ao passo que a Linha 10, apenas duas. No total, sua maior quantidade de estações da linha em comparação com sua outra metade, também pode ser observada, são dezoito estações contra treze estações.

A tabela abaixo contém um resumo das estações das duas linhas, que visa reunir dados do site oficial da CPTM e do site Estações Ferroviárias do Brasil.

Legenda: Relação de estações das linhas 7 e 10. Observação: Datas negritadas e na cor vermelha sinalizam que não foi possível precisá-las com exatidão. No caso das estações Lapa e Ipiranga, aceitamos a datafornecida pela CPTM, porém esta não reflete a idade do prédio atual

Com o aumento populacional que São Paulo viveu décadas atrás, fica evidente que as estações, sobretudo as centenárias, nasceram concebidas para um cenário de utilização muito mais modesto, com uma dinâmica na demanda de passageiros totalmente diferente. A Linha 7 também apresenta uma inserção urbana que dificulta o acesso a algumas das estações, bem como a intermodalidade com outros meios de transporte. Existe pelo menos um caso em que prefeitura da capital se comprometeu a implantar um terminal de ônibus, mas não concretizou a promessa, como noticiado em 10/03/2015 pelo jornal Folha de S.Paulo:

Entre os projetos que não saíram do papel, está o de um terminal em Perus (zona norte), antiga reivindicação dos moradores. Em 2013, após retomar o projeto ao custo de R$ 111 milhões, a gestão Haddad prometeu entregar a obra em dezembro de 2016, junto com outros três terminais nas zonas sul e leste.

Para conferir infográficos de evolução populacional e pirâmide etária ligados aos municípios da Linha 7-Rubi, utilize os links abaixo:

Podemos dizer que os problemas da Linha 7 estão relacionados à pendularidade acentuada, ou seja, devido à baixa oferta de postos de trabalho ao longo da linha, sua demanda carece de equilíbrio operacional, uma vez que um sentido tem movimentação altíssima, enquanto o sentido oposto tem movimentação baixíssima. A pendularidade é um fator que está relacionado com a ocupação do solo.

A CPTM tinha em tramitação uma licitação para criação de um serviço expresso ligando a capital e Jundiaí, com tempo estimado de viagem na casa dos 30 minutos, porém a licitação foi cancelada. Quanto ao novo serviço expresso, podemos destacar:

  • Processo 8154123011: Prestação de serviços técnicos de engenharia para a realização da pesquisa de origem e destino domiciliar, linha de contorno, linha de travessia, rede de simulação e modelo de demanda na aglomeração urbana de Jundiaí. Status: aditado;
  • Processo 8034120011: Prestação de serviços de engenharia, arquitetura e meio ambiente para consultoria e supervisão técnica de projetos básicos e executivos do Trem Expresso Jundiaí da CPTM. Status: revogado.

A criação de um serviço expresso é um passo importante na qualificação de um atendimento que respeite a extensão da linha. Em questionamento no Twitter, a CPTM deu detalhes breves sobre uma MIP (Manifestação de Interesse da Iniciativa Privada):


Futuro

De acordo com o Plano Diretor de Inserção Urbana da Rede da CPTM, o potencial de transformação urbana já está mapeado:

Legenda: Fonte: CPTM/Fupam

Em análise aos municípios, a Fupam destaca, por exemplo, a predominância de renda baixa entre as estações Francisco Morato e Jaraguá, média baixa entre as estações Vila Clarice e Piqueri, média entre Lapa e Palmeiras-Barra Funda e, finalmente, média-baixa na Estação Luz. Para os municípios da extensão operacional, Jundiaí tem renda média, Campo Limpo Paulista tem renda médio-baixa e Várzea Paulista tem renda baixa.

No Plano Diretor existe uma discrepância quando a Fupam alega que a Estação Francisco Morato foi totalmente reformada, analisando o texto, fica a impressão de que a publicação do plano se baseava num cenário que não se materializou. A estação provisória de Francisco Morato tem 5 anos e não pode ser descrita como dotada de “cobertura de plataformas em estrutura metálica com formato de asas”, a qual “provocou uma requalificação do espaço público onde está inserida. Promoveu a organização e tornou mais fácil as conexões entre diferentes modos de transporte, coletivos ou individuais”.

Em relação ao escopo das medidas, é preciso revelar que a Fupam mapeou ações de curto e médio prazo, envolvendo a CPTM e as prefeituras. O acompanhamento das ações e seus desdobramentos (incluindo as articulações entre diferentes esferas e secretarias), que deveria ser transparente, permanece na obscuridade.


Conclusão

Para finalizar e, num sentido amplo, considero que a Linha 7 possui os seguintes problemas:

  • Baixa oferta de empregos
  • O atendimento da Linha 7 a centralidades esbarra nos seguintes fatores: perda de prestígio (Luz), incipiência (Palmeiras-Barra Funda) e falta de ações transformadoras (Lapa e Água Branca)
  • Num cenário otimista, podemos dizer que a linha superlota a partir de Perus, situação que predomina então até a Palmeiras-Barra Funda
  • O caráter dormitório predomina em boa parte da linha, deixando de existir apenas em Jundiaí e na região do Centro Expandido de São Paulo (Água Branca em diante)
  • Intermodalidade deficiente ou inexistente
  • Padrão de serviço ainda muito díspar em comparação com o Metrô
  • Necessidade de um ou mais atendimentos expressos e/ou semi-expressos pela extensão da linha e seu caráter pendular

Devido à existência de cenários traçados pela Fupam há alguns anos, os quais não são transparentemente mostrados à população, é preciso vontade política para adotá-los.

Existe um potencial ligado ao turismo na linha (que também é destacado pela Fupam, diga-se de passagem), que é interessantíssimo e creio não existir, ao menos até o presente momento, algo parecido na Grande São Paulo, adicionalmente, o atendimento a Jundiaí configura algo único, pois a CPTM não tem buscado expandir a presença de seus serviços metropolitanos no interior do estado.

Parece existir má vontade política, talvez ainda presa aos episódios de 1996, mas para não repeti-los, é preciso investir, tanto para que o patrimônio histórico seja preservado — não podemos garantir sua preservação se a população voltar a se revoltar ferozmente contra os serviços prestados —, como também para colocar a Linha 7, de uma vez por todas, dentro do século XXI.




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